Por que os homens se matam mais que as mulheres?

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O mês de Setembro é dedicado à prevenção ao suicídio e uma das ações que são incentivadas é justamente o falar sobre o tema. Isso porque, geralmente, existe uma certa aura de mistério sobre esse assunto e até os órgãos de imprensa são orientados a não divulgar os acontecimentos, já que existem indicativos de que a ocorrência de um caso poderia servir de incentivo a outros.

Mas os dados estão aí para quem se interessar e neste texto vou fazer um pequeno recorte: o suicídio entre os homens.

 Dados da OMS

No relatório “Suicide worldwide 2019”, publicado em Junho de 2021, a Organização Mundial de Saúde (OMS) catalogou que uma em cada 100 mortes teve o suicídio como causa. No que diz respeito aos dados de gênero, foi observado mais uma vez que entre os homens há proporcionalmente mais casos consumados que entre as mulheres – cerca de 3 vezes mais – enquanto as tentativas são mais observadas no sexo feminino. Também fica evidenciado que as taxas de suicídio entre homens são mais altas em países de alta renda, o oposto acontecendo em países de renda baixa-média, onde o usual é encontrar taxas mais altas entre as mulheres.

Essas informações nos levam a querer saber: qual a causa para tal fenômeno?

Freud explica!

Sim, Freud e seus estudos organizados numa corrente psicológica chamada psicanálise pode nos ajudar a entender por que os homens se matam mais que as mulheres. Mas, também, a sociologia, a antropologia, as ciências humanas de um modo geral, aqui incluindo até a economia, e é a partir das pesquisas delas que sabemos que culturalmente os homens experimentam pressões diferentes que as mulheres.

De geração a geração sendo educados para serem fortes, demonstrar virilidade e controle, desde criança ao sexo masculino foi delegado um papel do qual se espera soluções, ação vigorosa e objetividade. O fator humano, neste caso, fica relegado a um plano menos importante, pois nele se incluem as emoções, um elemento historicamente relacionado à fragilidade. Sendo assim, o que os homens podem fazer com o que sentem?  

A saída para essa questão é de foro íntimo, totalmente individual e reflete a forma como cada um foi acolhido em sua infância, como sua personalidade foi estruturada. No entanto, em alguns casos ao menino não foi permitido expressar seus sentimentos, sob o pretexto tão falado de que “homens não choram”.

 “Melhor pra fora do que pra dentro”

Essa frase me remete a uma animação interessante que muitos adultos e crianças devem conhecer, chamada “Shreck”.  Para quem não conhece, estamos falando de um ogro, e esta é uma figura à qual muitos homens ainda se orgulham de se identificar, mas nos quatro filmes que compõem a saga do nosso personagem, o que vemos é que os ogros também tem sentimentos.

No entanto, o processo de socialização que hoje felizmente questionamos e estamos mudando, não ensina aos nossos meninos que suas emoções são legítimas e devem ser expressas. Sendo assim, o que eles são reforçados a colocar para fora são sua raiva, sua força, suas frustrações.  Estas, invariavelmente, são dirigidas aos alvos que estavam disponíveis no momento da explosão e que nem sempre eram os verdadeiros responsáveis.

O suicídio como resposta

Mas há, também, aqueles que não suportando mais sufocar sua sensibilidade, seus afetos, e não tendo coragem para enfrentar os rótulos, preferem tirar sua vida.

A identidade masculina está muito alicerçada em pilares como sucesso profissional e reconhecimento social. Isso se traduz em ter uma boa renda que lhe permita prover a família, conseguir ascensão na carreira que escolheu e exercer funções de liderança nos locais que frequenta. Quando isso não acontece apesar de seus esforços, a angústia, a depressão e outros comprometimentos à saúde começam a aparecer e é o momento de pedir ajuda. Mas... como assim? Pedir ajuda é reconhecer a fragilidade e isso não é comportamento para um homem.

Pedir ajuda é um ato de humildade que pode ser o divisor de águas entre sair fortalecido diante de seus problemas ou entregar os pontos e render-se ao culto à sua imagem. Infelizmente, muitos chegam ao ponto de achar que sustentar uma aparência de forte é mais digno do que se render à verdade que está vivendo.

Nos dias atuais em que, em decorrência da pandemia por COVID-19 muitos empregos foram perdidos e a qualidade de vida de diversas famílias foi atingida, o suicídio foi a saída para alguns homens que perderam a condição de arcar com a missão que entendeu que deveria abraçar. Em sua mente aprisionada pelos condicionamentos sociais que lhe foram impostos, deixar a família sem sua presença seria menos danoso que admitir que não teria como continuar sendo para eles o que achava que era. A pergunta é: menos danoso para quem?

Expressar sentimentos não é privilégio de gênero

No mês de Setembro, quando foi convencionado que o suicídio seria a pauta da saúde mental, entendo ser imprescindível alertar sobre o papel social do homem e o quanto os pesos que são colocados sobre ele podem contribuir com essas taxas alarmantes de auto extermínio. Se a morte auto infringida vem como resposta a uma dor maior que ultrapassa a capacidade individual de resposta, expressar o que se sente é o ponto de partida para encontrar a solução. Este é um recurso que deve ser ensinado a todo ser humano, independente do gênero com o qual se identifica.

  

@elienelima.psi


 

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